Callins, da diretora Thaís Borges, conta a história de cinco irmãs ciganas, analfabetas e viúvas de Joinville
Lindacir, Derli, Vilma, Maria Paula e Lucy são as protagonistas do filme Callins, comunidade cigana com acampamento firmado em Joinville que batiza o documentário de Thaís Borges. A obra conta a história da única comunidade cigana no Brasil e no mundo liderada por mulheres, e trata de temas como o universo Romani, a emancipação feminina, o matriarcado e as questões de gênero e de raça no Brasil. Callins, contemplado na edição 2015-2016 do Rumos Itaú Cultural, estreia no Canal Futura neste sábado (10), às 21h. A emissora também transmite o filme no dia 12, às 3h, e nos dias 14 e 17, às 2h.
Em um período de pouco mais de um ano, elas perderam seus maridos – mortos em acidentes de carro, assassinados ou acometidos por problemas de saúde. Uma delas decidiu se separar por sofrer violência doméstica. De acordo com a tradição, se desfizeram de todos os bens de seus esposos, como roupas, carros e tendas, pois dos mortos não se mantém nada, tudo deve ser queimado. Também, seguindo os preceitos tradicionais, deveriam ter retornado para a casa dos pais. Porém, em um movimento de ressignificação, decidiram se manter juntas, independentes, e buscar meios de sobrevivência. Vivem assim até hoje, com exceção de Lucy, que faleceu em 2018.
O filme explicita as condições subumanas em que vivem as irmãs: compram água potável na vizinhança, dormem embaixo de lonas, em um terreno que pertence a um conhecido empresário da região e é motivo de briga judicial, com problemas com ratos e dengue. Enfrentam diariamente o preconceito dos moradores locais e também de outras comunidades ciganas por terem rompido com o costume patriarcal. São mulheres que se reinventam como comunidade feminina, resgatando saberes ancestrais, em uma jornada de autodescoberta e empoderamento.
“Elas só queriam ficar juntas, unidas pelos laços de sangue e por suas trajetórias pessoais, por isso podem se tornar símbolo da luta feminina e cigana”, afirma a diretora, que é natural de Brasília, mora em Belém e conheceu uma das Callins no primeiro encontro nacional de povos ciganos, realizado em Brasília, em 2013. Mas foi a uma das integrantes da AMSK – Associação Mailê Sara Kalí que dividiu a história e criou a ponte para a realização do documentário.
O sustento vem da venda de panos de pratos e, principalmente, da confecção de vestidos ciganos, hoje feitos à mão, depois de suas máquinas de costura terem sido roubadas. Também recebem benefícios como o bolsa-família. Thaís conta que elas costuram sem usar tesoura ou fita métrica – rasgam os tecidos e tiram as medidas com as mãos. Para sobreviverem também produzem vestidos de noivas, um símbolo intimamente associado ao universo feminino e que, acredita Thaís, funciona como uma metáfora de suas vidas.

Para ela, o vestido de noiva pode ser considerado elemento estruturante das caminhadas dessas mulheres, já que todas se casaram muito cedo e passaram a pertencer às famílias dos maridos. É, da mesma forma, desestruturante, porque foi a perda dos maridos ou a separação que significou uma ruptura; e, agora, reestruturante, por representarem uma nova fonte de renda para garantir a sobrevivência. Funciona como elemento que costura a linha do tempo das personagens, que hoje vivem em situação de extrema vulnerabilidade.
“Na viagem mais recente que fizemos até lá, a situação era crítica: depois de um período de chuvas, uma das cinco irmãs havia contraído leptospirose e tinha sido internada com grave risco de morte”, relata a diretora. “A luta dessas mulheres ainda se faz em quesitos básicos e urgentes, como garantir a coleta de lixo no acampamento, o fornecimento de água e energia, vagas para os filhos na escola, atendimento médico, a comida de cada dia.”

Segundo Thaís, o filme, além de ser uma forma de empoderá-las, é importante para que elas mesmas se vejam como sujeitos com direitos e para que o país as reconheça, apesar e por causa de sua diversidade.
“Callins tem o objetivo de dar visibilidade política às demandas da comunidade e de servir de documento que ateste a sua existência”, finaliza a diretora.
Estreia do filme Callins
Exibições Canal Futura:
10 de outubro (sábado), às 21h
12 de outubro (segunda-feira), às 3h
14 e 17 de outubro (quarta-feira e sábado, às 2h