60 dias dentro de casa – Um diário ilustrado do isolamento traz quarenta obras produzidas entre março e maio

Em março, logo após a pandemia chegar a Santa Catarina e as autoridades recomendarem o isolamento social, o designer, jornalista e ilustrador Ivan Jerônimo teve a ideia de desenhar a paisagem que via pela janela do apartamento, no Córrego Grande, além de cômodos da casa e objetos comuns do cotidiano. Acostumado a participar dos encontros do Urban Sketchers Florianópolis, movimento que promove sessões de desenho ao ar livre do qual Ivan é um dos organizadores, ele decidiu continuar produzindo. O próprio projeto chegou a organizar encontros virtuais entre os participantes durante a pandemia.

“É igual tocar um instrumento ou frequentar academia. Se você para, mesmo que por pouco tempo, fica mais difícil voltar. Mas no caso dos desenhos de objetos, foi também uma maneira muito boa de aproveitar o tempo. O desenho de observação tem essa propriedade de proporcionar um estado de atenção que é tão difícil de se conseguir hoje em dia. Você esquece dos problemas e se acalma, embora não esteja necessariamente relaxado”, conta.

Depois de produzir mais de quarenta obras nesse período, feitas com pastel seco, caneta tinteiro, tira-linhas, aquarela, técnicas digitais, entre outros, ele decidiu reuni-las em um livro, que é o primeiro de sua trajetória. Além de designer, Ivan é jornalista e as obras são acompanhadas por textos divertidos que registram o espírito desses tempos estranhos.

A variedade de técnicas também deixa o livro dinâmico e é interessante porque alguns textos explicam processos do desenho. Ivan conta que o mais desafiador foi o de um abacaxi, por causa da coroa e de todos os gomos com cores que vão do verde ao laranja, mas também porque ele decidiu pintá-lo somente com aquarela, sem traço, técnica que não domina.

Ele começou a desenhar na faculdade de jornalismo, época em que chegou a trabalhar como assistente de arte. Mas só foi se reconhecer como ilustrador depois de uma oficina de desenho de modelo vivo que fez há cerca de vinte anos.

“Esse exercício de ficar duas horas desenhando, às vezes sem nem ver direito o resultado, foi muito importante para aprender a observar, a deixar de lado certas concepções de como eu achava que as coisas deveriam ser e observá-las como são. E, talvez mais importante, aceitar que esse tipo de desenho é um exercício, que eu não era obrigado a fazer uma obra prima cada vez que encostava o lápis no papel. Foi nessas sessões também que eu comecei a usar cor. Antes, era só grafite e carvão. A partir daí resolvi pintar também e mais recentemente a caligrafia me ensinou a importância da qualidade do traço”, relembra.

Enquantos muitos aproveitaram o tempo em casa para aprender a fazer pão ou desenvolver novas habilidades, Ivan aprimorou técnicas que já conhecia e ainda investiu em um projeto pessoal. Com 60 dias dentro de casa, que foi produzido de forma independente, o ilustrador também espera que o livro leve um pouco de otimismo para as pessoas.

“É curioso, porque o livro é um registro bem particular, mas de uma situação pela qual todo mundo está passando, ainda que eu me considere um pouco privilegiado. Acho que os traços e as palavras contam como essa grande epidemia mundial se reflete no pequeno cotidiano de um apartamento em um bairro comum de Florianópolis. Queria que quem lesse sentisse que dá de aproveitar essa época doida para fazer algo que te satisfaça, te faça sentir melhor, ainda que não tenha utilidade imediata. Porque, quando sairmos dessa, é isso que vai ficar”, finaliza.

Mais informações pelo site.