Duo Ío criou três alianças, gravadas com a data e o nome da obra, que foram lançadas ao mar de um barco de pesca na costa catarinense

Já imaginou caminhar pela beira da praia e vislumbrar, na areia, uma peça de ouro emergindo? O sonho de encontrar um tesouro naufragado inspirou a obra de arte “Trindade do Tempo”, do duo Ío, formado pelos artistas Laura Cattani e Munir Klamt. A dupla apresenta uma série de fotografias que registra o momento em que três alianças de metais preciosos são jogadas ao mar em Garopaba.

Ío é o duo formado em 2003 por Laura Cattani e Munir Klamt, ambos artistas, curadores e pesquisadores em arte contemporânea. Desde sua criação, a Ío tem realizado obras e exposições trançadas de histórias, mitos ancestrais, materiais exóticos (ouro, ossos, sal) e novas tecnologias, buscando unir o passado e o complexo presente que vivemos por meio de desenhos, fotografias, vídeos e instalações.

Os artistas criaram três alianças, duas em ouro e uma em prata, gravadas com a data e o nome da obra: Trindade do Tempo, e as lançaram ao mar de um barco de pesca na costa de Garopaba, conduzido pelo mestre Kaiko. Os anéis representam o Tempo: passado, presente e futuro em uma Trindade. Sua forma circular remete aos ciclos temporais, ao movimento das marés, à infinitude. Os anéis do passado e do futuro são em ouro, remetendo à duração, à ideia de uma herança que se preserva, um tesouro que se guarda, uma saudade, mas também desejos e sonhos, algo que se constrói com a esperança de que irá durar.

O anel que representa o presente, no entanto, é feito de prata escurecida e se refere ao breve contato com o instante em que vivemos. Como artistas, ambos observam e tomam para a criação das obras muito de suas vivências, e o sonho de encontrar algum tesouro trazido pelo mar era algo marcante em todas suas idas ao litoral – para Munir Klamt, especialmente, cuja família paterna é oriunda de Santa Catarina, onde circulavam inúmeras lendas envolvendo tesouros naufragados.

Laura Cattani, em uma visita à praia há alguns anos, encontrou um anel antigo, já bastante desgastado, trazido pelas ondas. Ficar imaginando toda a história por trás desse objeto, o longo e talvez inusitado trajeto que ele percorreu até chegar aos seus pés, foi o que faltava para dar corpo a essa proposta. Assim, a possibilidade de que alguém encontre e recupere essas alianças é parte constituinte da obra.

Trindade do Tempo é uma obra que mergulha na realidade, ao provocar a fantasia do público com o desejo de encontrar tesouros na beira da praia. Assim, esta obra é uma proposta que vai além das linguagens tradicionais da arte, ao estimular a participação do público, pois parte da aura deste trabalho está na curiosidade e no desejo que desperta. Os anéis estão perdidos? Ou poderão ser encontrados? Talvez a maré os leve de volta à praia, como um tesouro que depois de muito tempo volta à superfície? Talvez alguém consiga recuperá-los, em uma busca que envolve profundos mergulhos? Ou, como nos contos, ressurgirão em uma pescaria fortuita?

Foi ainda publicado um livro de contos, “O Fim do Presente”, que traz imagens da obra e um conto inspirado por ela, escrito pelo jovem autor Davi Koteck. O conto é sobre a relação de um filho adolescente com as memórias de seu pai, que ele via apenas nos veraneios na praia de Garopaba. Este material está disponível no link: torus.art.br/o-fim-do-presente